domingo, 30 de setembro de 2012

Não é o fim.

 Cheguei em casa, noite quente. Minha cabeça doía como de costume. No calor minha cabeça dói. Talvez tenha excedido no vinho.
 Tomei banho, lavei os cabelos, deito descoberta e penso em o quanto estou trabalhando demais e vivendo de menos. Não vi Mariana essa semana e já é quinta feira. Amanhã entregarei a ela nossas alianças, espero que ela se mude pra cá em breve.
 Dormi e não acordei. 
 Me vejo agora fora do corpo, externa.
 Engraçado morrer desse jeito, não era assim que eu esperava.
 Mas, então morri, é isso, assim, do nada?
 A morte precisa de aviso prévio!
 E as contas que deixei pra pagar amanhã? As alianças, minha e da Mariana, que ficou na gaveta?
 Pois é, eu que sempre brinquei de procrastinar a vida inteira agora me coloco a reclamar.
 Não tive tempo de reler Capitães de Areia, não ouvi Lenine, não dancei I'm Survive, não voltei a Nova Iorque. 
 Espero que encontre as alianças, meu amor. guarde-as com você.
 E minha mãe, que me ligou ontem e acabei a tratando mal, estava trabalhando. Não te abracei pela ultima vez...
 Queria, na verdade, um diagnóstico lento, ter tempo pra beijar minha mãe, abraçar meu pai e pedir desculpas a ele, afinal, não fui a filha médica e sim a rebelde desenhista.
 É, a morte não me mandou lembranças, me beijou rápido com sua boca fria, ríspida.
 O que me consola foi ver que a vida não acaba, ainda olho por quem amei, longe e tão perto, porém, sinto não poder mais tocá-los.
 Ainda sinto o gosto do vinho, mas minha cabeça já não dói mais.
 Agora, me resta apenas acostumar viver longe dos meus lápis, da minha louça sem lavar, sem acordar minha mulher pela manhã, sem falar com a minha mãe a noite.
 Me resta aprender a viver fora do corpo, dentro da alma.

domingo, 2 de setembro de 2012

Volver.

Nunca acreditei na eternidade do ''só se ama uma vez''.
 Pelo contrário.
 Acredito na capacidade de se amar sempre, mesmo que para isso seja necessária uma vida inteira pra se refazer prum novo amor.
 Acredito e defendo com unhas e dentes (talvez seja por puro medo de não ser capaz de amar de novo) que é sim possível viver um amor, depois de um amor, assim como uma criança volta a brincar depois de ter se machucado.
 Me encanta essa possibilidade de poder, sim, amar de novo.
 Amar mais e outra vez.
 Dizer que só se ama uma vez é coisa de gente com o peito ferido, magoado por não ter deixado de amar.
 No momento trago comigo um coração despedaçado, com mágoas latentes e um pequeno reservatório de lágrimas, mas não desisto em momento algum de amar de novo.  De sofrer de novo, me magoar de novo, me refazer e morrer por amor, quantas vezes for preciso.
 Enfrentarei o amor de cara limpa e coração aberto, mostrarei que assim como ele também tenho voz e sei gritar, porém não sei quanto tempo isso vai levar.
 Por enquanto eu sou só sangue, presa nessa dor lancinante que mais parece que fui mais uma vez abraçada por você, choquei meu corpo contra seus seios de lâminas afiadas e agora estou aqui, em carne viva.
 Mas sei que posso.
 E assim vai ser.
 Vou me reconstruir, me recolocar forte e inteira.
 E amarei.
 Tão destemida como no nosso começo, com toda a doçura doada a você, todo o amor que há em mim guardado.
 Esse amor que houve (e que há!) aqui sempre será seu.
 Ah, meu amor. Meu amor é seu, porém te peço alforria de suas mãos e te garanto sempre morada no meu abraço, mas agora quero voltar andar embebida de estrelas, assim como andei um dia por você.
 Você me permite tentar? 


 ''Um mar. O Mar. Do Mar. Ao mar. Eu.'' - Myriam Campello